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quarta-feira, 15 de abril de 2015

Resíduos de agrotóxicos estão presentes até no leite materno – artigo de Claudia Colucci

Para fortalecer o movimento de ação contra os agrotóxicos, no próximo dia 28 de abril a Abrasco vai lançar o livro “Dossiê Abrasco: Um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde”

Em Lucas do Rio Verde, vitrine do agronegócio no Mato Grosso, até o leite materno está contaminado por agrotóxicos - Foto divulgação internet

Leite materno contaminado por agrotóxico: este foi o tema que a articulista Claudia Colucci abordou na sua coluna semana no jornal Folha de São Paulo, publicada nesta terça-feira 14 de abril. 

O assunto vem sendo divulgado pela Abrasco desde 2011, quando a pesquisadora Danielly Palma apresentou uma tese onde avalia o impacto dos agrotóxicos em mães que estavam amamentando na cidade de Lucas do Rio Verde, Mato Grosso.

 O projeto de pesquisa foi coordenado pelo Professor na Universidade Federal do Mato Grosso - que há anos estuda os impactos do agronegócio na saúde coletiva, Wanderlei Pignati.

VEJA  TAMBÉM:

A pesquisadora que descobriu veneno no leite maternoContaminação de leite materno por agrotóxicos no Mato Grosso



Confira o artigo de Claudia Colucci na íntegra:



A exposição aos agrotóxicos causa inúmeros efeitos à saúde e está ligada a vários tipos de câncer. Não é achismo ou ativismo. É o que apontam vários estudos científicos ao longo das últimas décadas. Alheio aos sucessivos alertas, o Brasil segue ocupando a liderança mundial de consumo desses venenos.




Na semana passada, em um feito inédito, o Inca (Instituto Nacional do Câncer) se posicionou contra o uso de pesticidas e recomendou a sua “redução progressiva e sustentada” nas plantações. Alguém avisou o Ministério da Agricultura sobre isso? Segundo documento divulgado pelo instituto, a liberação do uso de sementes transgênicas no Brasil foi uma das responsáveis por colocar o país no primeiro lugar no ranking mundial, já que o cultivo das sementes modificadas exige grande quantidade desses produtos.

No Brasil, a venda de agrotóxicos saltou de US$ 2 bilhões para mais de US$ 7 bilhões entre 2001 e 2008, alcançando valores recordes de US$ 8,5 bilhões em 2011. Ultrapassamos a marca de 1 milhão de toneladas, o que equivale a um consumo médio de 5,2 kg de veneno por habitante. Para a indústria química, o alto consumo é efeito colateral de um objetivo nobre: aumentar a produtividade das lavouras brasileiras. A literatura científica aponta vários efeitos associados à exposição crônica aos agrotóxicos, como infertilidade, impotência, abortos, malformações, neurotoxicidade, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema imunológico e câncer.

MEDIDAS


Há medidas muito concretas que o país poderia adotar para frear esse abuso. Por exemplo, o fim da pulverização aérea, já banida em quase toda a Europa por causar dispersão dessas substâncias nocivas no meio ambiente. 

Apenas uma pequena parte do agrotóxico cai na planta, a maior parte fica no solo, na água e nas comunidades que moram no entorno das plantações. Mas tanto a indústria quanto o setor da aviação agrícola argumentam que suprimir a pulverização aérea reduziria em até 40% a produtividade das lavouras.

Outra medida defendida pelos ambientalistas é o fim da isenção de alguns impostos que o país a concede à indústria produtora de agrotóxicos. O preço de registro de novos agrotóxicos também funciona como incentivo ao setor.

É de no máximo US$ 1 mil. Nos EUA, custa até US$ 630 mil. Por último, o Brasil deveria banir a comercialização de princípios ativos proibidos em outros países. 

Um dossiê de 2012 da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) aponta que, dos 50 produtos mais utilizados nas lavouras brasileiras, 22 são proibidos na União Europeia.


LEITE MATERNO


Outro documento, da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), mostra que grande parte do estoque de produtos organofosforados banidos na China em 2007 tem sido enviados ao Brasil. Uma consequência cruel do alto consumo de agrotóxico no país foi muito bem documentada em 2011, numa pesquisa da Universidade Federal do Mato Grosso em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz: até mesmo o leite materno pode conter resíduos de agrotóxicos.

O estudo coletou amostras em mulheres do município de Lucas do Rio Verde (MT), um dos maiores produtores de soja do país. Em 100% delas foi encontrado ao menos um tipo de princípio ativo desses produtos. 

Em algumas, até seis tipos. Qual é a alternativa? 

Para a indústria, não há. Segundo ela, uma alimentação 100% orgânica levaria a uma inevitável queda de produtividade e não só Brasil, mas o mundo teria grande dificuldade de suprir alimento para a população.

Ambientalistas, pesquisadores, produtores de orgânicos e o próprio Inca discordam. 

Dizem que se houvesse apoio de políticas públicas, crédito, pesquisa e assistência especializada seria possível construir um novo modelo agrícola, com alimentos livres de agrotóxico.

 Essa é uma bandeira deveria ser encampada pelas redes sociais. 

A saúde e o ambiente agradecem.

Fonte: ABRASCO

Um comentário:

  1. É instrutivo baixar a tese de Danielly Cristina de Andrade Palma (2011), onde ela investiga a presença de alguns pesticidas no leite materno, e ler com atenção. Nas conclusões da tese ela nos informa:
    • O p,p' - DDE foi encontrado em 100% das amostras analisadas, o que sugere uma exposição passada ao p,p' - DDT, já que este é o seu metabólito mais estável e foi bastante utilizado até 1985 na agricultura e até 1998 no controle de vetores.
    • O β-endossulfam foi encontrado em 44% das amostras analisadas, sugerindo uma exposição atual, já que é muito utilizado como inseticida na agricultura na região de estudo.
    A autora não investigou os herbicidas, que são os únicos associados com os transgênicos. Os que estão acima são inseticidas, cujo uso foi reduzido nas lavouras transgênicas que apresentam resistência a inseto.
    Os leitores vão ver que o DDE, provavelmente derivado de uma exposição antiga ao DDT, é o principal pesticida detectado. O DDT não é mais usado faz anos, mas ele bioacumula no organismo. O outro inseticida, o endossulfam, é extensamente empregado na agricultura. Os resíduos de endossulfam estão em geral abaixo do limite máximo de resíduo considerado como seguro. O quadro epidemiológico, entretanto, sugere que o modelo de agricultura está ligado aos casos clínicos de abortos e mal formações.
    Não foram estudados herbicidas, como o glifosato e o glufosinato de amônio, que são hoje os únicos ligados às lavouras transgênicas. Enquanto estes dados não estiverem disponíveis, é errado atribuir aos transgênicos um aumento do uso ou do impacto dos agrotóxicos na saúde, em particular na questão do leite materno, da gestação e do surgimento de mal formações.

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